À Beira do Abismo Me Cresceram Asas

À Beira do Abismo Me Cresceram Asas

Um texto que faz refletir sobre o tempo, a solidariedade e a simplicidade. Conta a história de duas amigas que vivem em um asilo e  são interpretadas com todo cuidado e carinho por  Maitê Proença e Clarisse  Derzié.

Valdina (Clarisse)  tem 80 anos, sonhava em ser bailarina. Gosta de rir, de dançar, de cantar. perdeu a família e ficou sozinha no mundo. Seu bordão “Oh, Glória!” acaba  sendo uma metáfora, uma máscara para as “inglórias” de sua vida. Já Terezinha (Maitê) tem 86 anos, vive a depressão do abandono, adora contar histórias antigas e esconde um segredo. A personagem mostra a velhice sem artifícios. E talvez por isso, pela sinceridade diante dos dissabores, diante do abismo lhe crescerão asas.

“Nada melhor que o humor para se evitar a autopiedade e a pieguice”, diz Maitê. E essa afirmação é levada a sério na peça que  abre um mundo de fantasia e reflexões, baseados no baú de lembranças das personagens. Aborda o tempo, a solidariedade e a importância de compartilhar, de forma leve e bem humorada.

“Uma dor partilhada é metade da tristeza. Mas a felicidade, quando a gente divide, parece que dobra”

“Você pode perder casa, carro, dinheiro, pode perder até um verdadeiro amor. Mas se falta talento pra rir, aí meu filho, danou-se tudo”

Durante o espetáculo, é notória a generosidade e Maitê com a colega de palco,  muitas vezes, de costas ou de lado, ou simplesmente em silêncio, apontando o olhar do espetador ao trabalho de Clarisse. E Valdina brilha, rouba a cena, faz jus ao destaque com um trabalho de força, com bom uso da voz, dos tempos e das expressões corporais. Entrega total ao teatro, que é a sua verdadeira paixão.

As duas senhoras falam sobre tudo: Sexo, abandono, família, casamento, virgindade, homossexualismo, das diferenças entre homens e mulheres e até sobre “bater sininho”.Tudo de forma simples, espontânea e direta, sem as máscaras habituais da juventude, oscilando entre a emoção e o humor, mostrando que aprenderam a simplificar a vida já que não há mais tempo de complica-la.

“Asas é para quem gosta de ser mexido por dentro. Velhas contém todas as idades. E é uma fase em que caem as máscaras, não se tem mais cerimônia para tratar as coisas, há autoridade. A meu ver, é tão interessante…”  diz Maitê.

“Você que é jovem, viva com calma, saboreando, porque passa feito um cometa: Olhou, zarpou, você nem viu. Aliás, esse é um defeito dos jovens: Ansiedade demais”

O texto é cheio de pequenas incongruências, mudanças abruptas de assunto, para que as atrizes voem no mundo da fantasia ou das suas próprias recordações.

“Eu sou alegre de teima. Porque esta vida, pra valer, é um arrastar de correntes. É tanto sonho que a gente larga pelo caminho, tantos planos, tantas expectativas, quase nada deu certo. A vida foi tomando um rumo próprio, diferente. Quando me dei conta, o tempo havia passado e eu não tinha virado a mulher que a menina sonhou”

Paralelamente à carreira de atriz e dramaturga, Maitê segue seu trabalho como escritora e é ela quem assina o texto “A Beira do Abismo me Cresceram Asas”, que também virou livro.

“Levei 86 anos para chegar até aqui e não sei se vou ter a possibilidade de fazer  o que deve ser feito – acho que não- mas também não importa, as minhas conquistas eu levo comigo, e o que será, será. Estou à beira do abismo, mas me cresceram asas”

Um texto lindo. Uma peça lúdica. Retrato encantador de duas mulheres. Um diálogo tocante, cujo resultado final é um retrato emocionado e poético do universo dos que sabem tanto e podem tão pouco.

Confira trecho da peça:


Galeria de fotos:

 

SERVIÇO

À Beira do Abismo Me Cresceram Asas

Local: Theatro Net Rio

Elenco: Maitê Proença e Clarisse Derzié

Texto: Maitê Proença

Direção: Maitê Proença

Fotos: Lúcio Sacramento e Paula Kassatz

Edição do Vídeo: Lana Isa Galiza

Luciana Leal veste look Attualitá Maglieria

Lu Leal

Formada em Comunicação Social, atuou na produção do Programa “A Bahia Que a Gente Gosta”, da Record Bahia, foi apresentadora da TV Salvador e hoje mergulha de cabeça no universo da cultura nordestina como produtora de Del Feliz, artista que leva as riquezas e diversidade do Nordeste para o mundo e de Jairo Barboza, voz influente na preservação e evolução da rica herança musical do Brasil. Baiana, intensa, inquieta e sensível, Lu adora aqueles finais clichês que nos fazem sorrir. Valoriza mais o “ser” do que o “ter”. Deixa qualquer programa para ver o pôr do sol ou apreciar a lua. Não consegue viver sem cachorro e chocolate. Ama música e define a sua vida como uma constante trilha sonora. Ávida por novos desafios, está sempre pronta para mudar. Essa é Lu Leal, uma escorpiana que adora viagens, livros e teatro. Paixões essas, que rendem excelentes pautas. Siga @lulealnews

2 Comments

  1. Lúcio Sacramento
    Lúcio Sacramento
    24 de janeiro de 2015 at 11:03 Reply

    Texto maravilhoso. Sua resenha da peça transmite primorosamente a emoção dessa belíssima obra. Parabéns Lu. Parabéns Maitê e Clarisse.

  2. Avatar
    Acácio
    28 de janeiro de 2015 at 11:28 Reply

    Olha, gostei muito da matéria. Parabenizo pela troca de experiências.

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