Edvana Carvalho

Edvana Carvalho

Atriz, educadora, mãe. Guerreira, baiana e linda. Começou a estudar teatro ainda na escola e foi se encantando mais e mais pela profissão. Não é preciso muito tempo de conversa para se encantar com seu jeito espontâneo e seu sorriso franco. Foi em uma tarde linda na Bahia, tendo as águas da Barra e o farol como testemunhas, que conversamos com  Edvana Carvalho.

DMJ: Edvana, conte -nos um pouquinho sobre seu novo projeto

Edvana: Eu estou  entrando com o novo personagem na internet e a personagem, a Zefinha Goldenheart, já tem uma fanpage no Facebook.  Eu queria brincar com essa coisa de mulheres que falam sobre tudo e ainda mexericam a vida dos outros. A Zefinha tem um Programa na web,  que se chama “Opinião Formada”. Ela é bem sincera, bem espontânea. O Programa é dela, foi o marido quem deu e ela fala o que dá na telha rsrs. E ela se contradiz, uma hora você pensa que ela esta a favor daquela ideia depois ela se contradiz. Através da Zefinha, eu aproveito com muito humor pra falar de coisas que eu acho interessante. E ainda tem uma parte do programa que ela vai sortear a cartinha dos telespectadores. Hoje em dia a gente usa muito e-mail, whatsApp, tudo é muito moderno, né?  Mas ela tem uma coisa meio década de 80: A cartinha que sorteia a blusa de ombreira , sabe? ela é bem anos 80.

DMJ: De onde vem o nome Zefinha Goldenheart?

Edvana: Eu queria um nome bem brasileiro, que lembrasse bastante o Brasil e que ao mesmo tempo desse um certo Glamour a personagem. Então eu escolhi Zefinha e minha filha, Luana Benifei, deu a ideia de complementar com o “Golden heart” , que significa coração de ouro. E é bem a cara da personagem mesmo, ela é incrível. Eu adorei a ideia e o Vinnícius Morais, que está me dirigindo no projeto, também. Então ficou Zefinha Goldenheart e o programa já foi lançado, ela já está com a corda toda.

DMJ: Como  nasceu a ideia desse projeto?

Edvana: Fazer essa personagem veio da minha vontade de comemorar os 30 anos de carreira,  contando desde que comecei a fazer teatro na escola pública.  Eu precisava fazer uma coisa sozinha porque eu sempre trabalhei muito em grupo, e eu adoro trabalhar em grupo, mas  eu queria fazer uma coisa minha, sabe?  Que fosse a minha cara, que fosse mais pra o lado do humor. E a Zefinha pode ser tudo, pode  ser comentarista de um programa de rádio, pode ser da web, pode ter um programa de TV, pode ir para o teatro. Ela pode ser qualquer coisa.

DMJ: Você começou com 16 anos fazendo teatro na escola. Mas como foi a sua  trajetória até aqui?  

Edvana: Quando eu tinha uns 7, 8 anos, tinha uma adolescente onde eu morava e  sempre nos reuníamos no final da tarde para ler  livros de histórias,  de fábulas. Eu fui me encantando com aquele mundo, imaginando os figurinos… até que um dia perguntei pra ela o que eu precisava para ser atriz. E na época ela me disse uma palavra que mais parecia um palavrão rsrs. Ela disse, “você vai ter que estudar Artes Cênicas”. Aí quando eu cheguei em casa, fui correndo falar pra minha mãe e ela disse logo que não, que eu teria que estudar e que só poderia fazer teatro depois que me formasse. Eu sempre brinquei de teatro, ficava na frente do espelho, fazia maquiagem. Quando eu estava na oitava série, Terezinha, minha professora, resolveu abrir um curso de teatro e perguntou quem queria participar. Claro que eu fui a primeira a me candidatar rsrs. Quando conclui a escola, minha mãe  sugeriu que eu fizesse o magistério pra ter uma base, uma profissão, devido a incerteza da carreira artística. Depois que terminei o magistério, tive que sair da escola e deixar o curso de teatro. Foi aí que  um amigo me falou do SESC e aí começou a minha luta, porque o curso era no Pelourinho e naquela época ele não era lindo e bem cuidado. Era um bairro de moradores,  mas tinha muita prostituição ainda, não é como hoje  que se pode ir em qualquer rua do Pelourinho. Eu desafiei isso, recebi muitas críticas em casa, fui pra o centro da cidade, fui pra o Pelourinho. Passei nos testes e comecei a fazer teatro com Sônia de Brito. Tive a oportunidade de  trabalhar  com improvisação, de estudar teatro e dança com os melhores professores da época e de conhecer colegas que são amigos até hoje.  

DMJ: E o bando de teatro Olodum?

Edvana: Já no finalzinho da minha participação nesse  grupo, soube que o Olodum ia fazer várias oficinas de arte: Dança com Isaura, percussão com Neguinho do samba, teatro com Marcio Meirelles e Chica Carelli. Tinha também Hebe Alves,  Leda Ornellas (coreógrafa),  Zebrinha, que também é um grande mestre e  Jarbas Bittencourt. Esse grupo foi maravilhoso pra mim, eles são todos incríveis e ajudaram bastante na minha formação. Sai dali com alguns amigos e formamos o Bando. Na época,  a gente achava que seria apenas uma oficina de verão. Mas eu já era muito apaixonada pelas músicas do Olodum, eu descia o Pelourinho pra ensaiar e ficava ouvindo aquelas músicas de protesto. Nós tínhamos criado o primeiro espetáculo do grupo que era “Essa é Nossa Praia” e falava do universo do Pelourinho, das suas personagens, suas situações.O 2º espetáculo  foi “Ó Paí Ó” e o terceiro foi o  “By By Pelô”. No primeiro, a gente fazia apresentações gerais dos personagens e das situações. No 2º,  a gente foca na situação da matança das crianças que estava sendo muito grande em todos os estados e que no Pelourinho também acontecia. No 3º, a gente começa a falar da expulsão dos verdadeiros moradores do Pelourinho para que chegasse o comércio de fora. E da importância de se deixar de pé os casarões que contam a nossa história. Isso é muito interessante pra mim porque esses casarões e igrejas foram construídos pelos meus antepassados e é claro que quero que eles permaneçam de pé para contar a história para os meus filhos, netos e bisnetos.

DMJ: Qual é a importância do Bando na sua carreira? 

Edvana: Ah… é enorme! Porque, na verdade, é no Bando que eu começo a minha formação profissional. Antes disso, só havia feito teatro amador. Foi lá que comecei a me apresentar profissionalmente, a ganhar dinheiro com isso. Foi o meu portal para a vida de artista adulta, que ganha dinheiro com a arte que faz.

Meu papel é abrir a consciência daquele aluno da escola pública, faze-lo perceber  que a escola é a arma que ele precisa para crescer e que ele vai precisar de conhecimento para competir por uma vaga no mercado de trabalho.  É preciso ter ferramenta pra competir, pra não ficar só com as funções subalternas. Eu tenho essa preocupação de empoderar essas crianças, pra elas quererem ir pra escola, quererem aprender.

DMJ: Você fez duas temporadas de Malhação, isso te ajudou como educadora?

Edvana: Muito! Quer queira ou não, a TV te dá um deslumbre, as pessoas te enxergam de uma forma diferente e a Globo é realmente uma janela enorme. Foi maravilhoso ter a oportunidade de trabalhar com a mesma faixa etária dos meus filhos, dos meus alunos da escola.  Essa oportunidade fez os  meninos quererem me ouvir, porque eles não só estão me vendo como professora. mas também como a artista que eles admiram. Então, eu aproveito essa admiração pra poder falar com eles um papo reto, eles me ouvem com mais propriedade. Por exemplo, eu dei uma palestra em determinado lugar e depois de 3 dias, soube de um menino que saiu do tráfico porque eu tinha dito que ele podia ser o que ele quisesse, entendeu? Quando eu vou fazer uma palestra, eu foco nesse ponto. Quero que meu aluno veja a escola como uma ferramenta a favor dele. Porque, infelizmente,  muitos não conseguem enxergar o sentido de ir pra escola. Ele vê sentido em ganhar o dinheiro dele e isso pode ser feito de qualquer jeito, vendendo bala, trabalhando no shopping ou até fazendo coisas erradas. Meu papel é abrir a consciência daquele aluno da escola pública, fazê-lo perceber  que a escola é a arma que ele precisa para crescer e que ele vai precisar de conhecimento para competir por uma vaga no mercado de trabalho. Aí eu começo a falar de Zumbi pra eles. Zumbi  é lembrado até hoje,  mesmo depois de tanto tempo porque ele não era qualquer um, ele foi um cara que foi criado por padres e que se preparou, aproveitou todas as oportunidades para aprender e graças a sua formação, pôde ser o general estratégico que ele foi, o negociador, o guerreiro.  É preciso ter ferramenta pra competir, pra não ficar só com as funções subalternas. Todo trabalho honesto é maravilhoso, mas tem uma hora que a gente precisa  mudar um pouco e deixar de ser a pessoa que atende no balcão da loja pra ser o dono da loja. Eu tenho essa preocupação de empoderar essas crianças, pra elas quererem ir pra escola, quererem aprender. Mostrar pra eles que eles vão poder ser o que quiserem, desde que se esforcem pra isso. Eu amo ser atriz, é meu sonho desde muito cedo. Mas trabalhar com educação, foi a forma que eu encontrei de devolver ao mundo o que eu recebi. Sou professora de teatro, com muito orgulho.

Foi uma honra representar essas mulheres que me lembram as minhas tias, a minha mãe. Eu não quero passar o resto da minha vida fazendo a empregada doméstica, mas as que eu já fiz, foram em homenagem a essas grandes mulheres da minha vida.

DMJ: Como foi a experiência de participar de duas temporadas do mesmo folhetim, com duas personagens diferentes?

Edvana: Malhação é um projeto maravilhoso e a cada temporada muda tudo, as histórias, os atores, a direção….Fabio Zambroni é um produtor de elenco maravilhoso, consegue formar elencos diversos, mistura tudo e eu acho isso incrível porque a vida consiste justamente nessa mistura. Na 1ª vez, eu tinha dois filhos, um era Pedrinho do Cavaco e o outro era o Jefferson, um cadeirante. Nessa última fui a mãe da Jennifer Nascimento, uma menina muito talentosa. Ela canta muito, é uma excelente atriz e uma pessoa linda. Eu tenho pelos meus filhos da ficção um carinho enorme e a gente se fala sempre, me preocupo de verdade com eles. Eu amei os dois trabalhos, ambos tiveram textos muito bem feitos. Nas duas vezes fiz a mulher negra de periferia, mostrando a batalha de criar o filho dos outros e deixar o seu em casa porque precisava sair pra trabalhar.  Foi uma honra representar essas mulheres que me lembram as minhas tias, a minha mãe. Eu não quero passar o resto da minha vida fazendo a empregada doméstica, mas as que eu já fiz, foram em homenagem a essas grandes mulheres da minha vida.

DMJ: Você declarou que quando fica fora, sente falta da energia e da religiosidade da Bahia. Você é muito ligada a religião? 

Edvana: Sou sim, mas eu nunca fico muito tempo fora da Bahia. Eu vou pra o  Rio, gravo e volto,  porque tenho meu trabalho aqui e ele é muito importante pra mim. Mas até quando estou de férias, se ficar uma semana inteira longe de Salvador, já sinto a falta da religiosidade. Aqui a gente entra numa igreja, assiste uma missa, depois vai lá toma um banho de folhas ou de pipoca e depois vai meditar. Eu acho isso tão incrível! No dia do meu último aniversário, acordei, joguei tarô pra mim mesma e fui assistir uma missa, mas  peguei um trânsito intenso e cheguei já no finalzinho. Fiquei meio desanimada, mas percebi um movimento dentro da igreja, uma pessoa fazendo Tai Chi Chuan. Só na Bahia pra pessoa ir assistir uma missa e encontrar Tai Chi Chuan, meditação rsrs. É incrível essa cidade! rsrs. Quando terminou tudo, uma voz atrás de mim começou a cantar parabéns. Quando eu me virei, vi Luciana Souza, a Joana, de “O Paí Ó”. Eu fiquei tão feliz, foi um presente maravilhoso! Foi lindo, todos cantaram parabéns pra mim. Quando saí de lá fui molhar os pés nas águas do Buracão. Foi um dia maravilhoso!! rsrs

Sempre faço questão de mostrar pra quem está começando que existe uma diferença muito grande entre querer ser atriz e querer ser famosa.

DMJ: Os baianos  cobram muito por sua participação na TV?

Edvana: Cobram demais! Aonde eu chego, falam que querem me ver na TV, porque eu os represento. E isso é maravilhoso, fico muito feliz porque as pessoas da minha cidade acompanham e gostam do meu trabalho na TV. Até porque eu faço pra elas em primeiro lugar e depois para o resto do país.

DMJ: E por falar nisso, como foi fazer “O Paí Ó”, um filme gravado em Salvador e com a maior parte do elenco baiano? Esperava todo aquele sucesso com o filme?

Edvana: Lá atrás, quando a gente fez a peça,  eu tinha apenas 21 anos e a gente nunca pensou em cinema. Aliás, quando eu quis ser atriz, eu nunca pensei em TV e cinema, eu sempre pensei em teatro, mas a minha  trajetória foi me levando para  TV e para o cinema. Inclusive, sempre faço questão de mostrar pra quem está começando que existe uma diferença muito grande entre querer ser atriz e querer ser famosa. Mas claro que foi uma emoção ver o nosso trabalho do teatro ir para o cinema e mais tarde pra TV. “Ó Paí Ó”  é um filme que representa o Brasil, inclusive tenho notícias de muitas pessoas que moram fora e que fazem questão de assisti-lo sempre,  para matar a saudade do nosso país. Ele faz parte do nosso cotidiano, as pessoas cobram a sua volta. Eu não sei na TV, mas em fevereiro, Iemanjá, a gente já vai estar filmando o segundo filme de “Ó Paí Ó.

DMJ: Que notícia maravilhosa! E ainda tem a questão da representatividade, né?  Porque o baiano não está tão acostumado a ver cenários da Bahia na TV e no cinema. Ele sente falta de assistir os lugares que fazem parte do seu próprio cotidiano.

Edvana: E quer um lugar mais baiano que o Pelourinho? Esse é um dos motivos do sucesso do filme. E o elenco já se conhece há muito tempo, rola uma empatia, uma amizade, uma desenvoltura muito grande. E é o nosso universo, nosso jeitinho, nossas gírias. É muito bom! Eu posso até  estar no ar fazendo algum trabalho novo, mas as  pessoas ainda me cumprimentam nas ruas por causa do filme. E olha que ele já tem uns anos que foi lançado!

É preciso que haja mais incentivos e não apenas para espetáculos de pessoas famosas. Vamos distribuir mais, pra que a gente possa oferecer bons espetáculos com preços acessíveis. Se a gente quer uma igualdade, se quer uma população educada em relação à arte, não pode oferece-la só para um determinado grupo. Você tem que abrir mais, tem que ter mais teatros, mais cinema, mais circo em todas as comunidades. Se for um preço popular, as pessoas irão.

DMJ: Você é mais do dia ou da noite?

Edvana: Eu sou do dia e da noite. Eu gosto de acordar cedo, eu vou malhar, eu vou dar aula, eu vou fazer qualquer outra coisa. Eu curto tudo que é de dia, eu gosto de praia, do pôr do sol, eu gosto de ir pra montanha, de fazer caminhadas, de tomar banho de cachoeira… e tudo isso é de dia. Aí quando chega a noite, não tem como não ser da noite.  Eu sou atriz, eu sou um pouco boêmia, eu tenho que ensaiar à noite, eu  me apresento à noite e quando não estou em cartaz,  vou assistir as apresentações dos meus amigos. Eu não sou muito de bar, essas coisas, mas gosto de ir assistir espetáculos e depois sair pra comer alguma coisa. Então, eu me sinto do dia e da noite. Do dia porque eu acho que sou Edvana do dia mesmo e da noite por causa da minha profissão.

DMJ: O teatro deveria ser parte indispensável na formação educacional e cultural de um povo. Mas a realidade é bem diferente. Pra você, como atriz e educadora, como a população poderia ser educada em relação à arte?

Edvana: Eu acho que a arte deveria ser subsidiada pelo governo, assim os artistas não teriam que se preocupar em pagar as contas através da bilheteria. Porque artista até faz de graça, pelo prazer de atuar. Mas técnico não faz, por exemplo, e a gente precisa deles. Eu tenho que pagar o menino da luz, tenho que comprar o material pra a produção, tenho que pagar o teatro, pagar quem vai fazer a música do espetáculo, pagar coreógrafo, pagar quem vai fazer meu transporte, pagar minha gasolina, entendeu? Então, o artista tem que se preocupar com tudo e isso  encarece o valor do ingresso do espetáculo. É preciso que haja mais incentivos e não apenas para espetáculos de pessoas famosas. Vamos distribuir mais, pra que a gente possa oferecer bons espetáculos com preços acessíveis. Até que em Salvador, temos bons valores de teatro, mas poderia ainda ser mais barato. Outra coisa super importante é teatro em todos os bairros. Porque a galera pensa em sair de Cajazeira 10 pra vir no Vila Velha assistir uma peça? Não vem, porque a gente não tem metrô , não tem nada que facilite a mobilidade urbana. Mas se eu tenho um bom teatro em Cajazeiras, um bom complexo de cinemas lá, a população vai consumir mais a arte. Os artistas e produtores vão ter a oportunidade de se apresentar na região, as coisas vão deixar de ser setorizadas só no centro da cidade, para quem mora próximo dali. A gente não tem uma cultura de teatro em Salvador e isso tem que mudar.

A terra e o universo são o que me sustenta no eixo e Iansã é que me dá força pra vencer os desafios.

DMJ: Infelizmente  isso é uma coisa geral. Até no Rio de Janeiro, que temos um maior número de teatros que aqui, a maioria deles estão localizados na Zona Sul. Quem mora na Barra, no Recreio, em Vargem Grande,  tem pouquíssimas opções e mesmo com metrô, o acesso é complicado devido as grandes distâncias. Em Salvador essa realidade é ainda mais penosa.

Edvana: Se a gente quer uma igualdade, se quer uma população educada em relação à arte, não pode oferece-la só para um determinado grupo. Você tem que abrir mais, tem que ter mais teatros, mais cinema, mais circo em todas as comunidades. Se for um preço popular, as pessoas irão. O adolescente vai, o idoso vai, o adulto vai, os pais vão levar as suas crianças. O menino pode chegar no teatro mal educado, gritando, mas o próprio ambiente o educa, porque ele vê como as outras pessoas se comportam, ele se diverte, ele escuta, ele aprende. É fundamental distribuir melhor as coisas no nosso país. E a gente sabe como isso é difícil, visto o momento político que estamos vivendo, que muita gente só pensa em distribuir entre as suas próprias contas bancárias.

DMJ: Você tem alguma mania antes de entrar no palco?

Edvana: Ah eu tenho duas manias. Uma fora do palco que é comprar comida rsrs. Eu tô trabalhando, eu tô passeando, se eu passo em um lugar que vende comida, eu compro nem que seja um quiabo, um pedaço de abóbora rsrs. Toda hora eu invento alguma coisa pra ir no Supermercado, comprar uma coisinha. Mas antes de entrar no palco, independente dos aquecimentos, dos rituais com o grupo, quando eu estou na coxia, nos minutos que antecedem minha entrada, tenho o meu próprio ritual. Eu visualizo meu eixo, visualizo uma luz que se conecta com o centro da terra, o centro do universo. Aí eu visualizo várias pétalas brancas e douradas caindo em cima de todo palco, de toda a plateia. Só então me sinto pronta. Aí, peço licença a Iansã e entro em cena. Com isso, eu trago uma coisa gostosa que não é só pra mim, é pra todo mundo que está ali bebendo daquela fonte, porque teatro é um ritual, está todo mundo centrado, é uma energia muito grande. E é  justamente essa energia que é trocada com os atores que estão em cena. A terra e o universo são o que me sustenta no eixo e Iansã é que me dá força pra vencer os desafios.

Apesar de ser lindo, é muito difícil ter pele de ébano. E eu não tô chorando não, viu! Eu acho que tenho até muito em relação a muita gente. Mas essa é uma dificuldade, que as pessoas as vezes tentam esconder.

DMJ: Qual é a sua opinião em relação a apropriação dos elementos da cultura afro?

Edvana:  Me diga, onde não foi que o negro começou uma coisa e o branco não se apropriou e ganhou dinheiro em cima? Foi assim com o Rock, por exemplo. Eu descobri na Argentina que o tango é preto, é uma mistura dos imigrantes italianos com os negros, porque eles lá eram jogados nas favelas e foi assim que o tango foi criado.  O Blues, o Jazz… e quem ganha dinheiro com isso? Realmente é pra se refletir. Claro que os artistas brancos podem cantar as nossas músicas, o  que não pode é eles receberem todos os méritos de uma coisa que não foi eles nem os antepassados deles que criaram. Quanto a roupas e adereços, eu acho que tudo que é bonito de se ver, de se mostrar, tá aí pra todo mundo. Então, eu acho que uma menina branca pode sim, trançar o cabelo dela e que bom que ela está vendo beleza no nosso estilo, no nosso turbante. O que eu não posso é valorizar mais o turbante nela do que em uma menina negra, que já usa desde pequena. Essas são as maluquices, entendeu? Infelizmente hoje a gente ainda não é valorizado como deveria, então a gente tem que acordar pra esse tipo de coisa e “meter o pé na porta” pra ser valorizado. Por isso é tão importante o empoderamento, a aceitação e valorização das próprias raízes.

DMJ: Qual foi o seu maior desafio como atriz até aqui?

Edvana: Sem dúvidas a minha cor da pele. Porque ela as vezes me impede de alcançar certas oportunidades, apesar da minha qualidade de atriz. Parafraseando a Viola Davis, o que separa uma atriz branca de uma atriz negra é só a oportunidade. Porque você olha o currículo de uma atriz branca e ela já fez vários filmes, não sei quantas novelas… mas ela fez tudo isso porque teve oportunidade, sabe? No meu caso,  quando vou é uma oportunidade a cada mil anos, sempre com papéis que não são o principal da trama. Mas a gente  é resistente, a gente é neto de Zumbi e continua tentando. Apesar de ser lindo, é muito difícil ter pele de ébano. E eu não tô chorando não, viu! Eu acho que tenho até muito em relação a muita gente. Mas essa é uma dificuldade, que as pessoas as vezes tentam esconder.

DMJ: Como é a Edvana Mãe?

Edvana:  Acho que é minha maior obra na terra. Sempre fui “dura”, cobro demais e não relaxo rsrs. Agora que estão grandes, desfruto da companhia e amizade. Luana 23, linda e virginiana, aí já viu, se não entro nas regras dela, estou ferrada. Davi Sol um legítimo canceriano tranquilo. Eles são a luz da minha vida. Faria tudo de novo.

DMJ: Um lugar

Edvana: Qualquer lugar que tenha mar. O mar é o meu lugar, me tranquiliza, me traz fartura porque me traz peixe, me deixa mais perto de Deus, da Deusa. Porque eu acho que Deus na verdade é uma Deusa. Se quem gera é uma mulher, como é que Deus pode ser masculino, gente? Não tem condição, não é possível rs. O amor da grande mãe é a parada principal. Eu acredito que  essa grande força só pode ser feminina.

DMJ: Eu ia te perguntar uma coisa, mas depois dessa eu acho que vou pular porque eu acho que já sei a resposta rsrs

Edvana: E vai me deixar na curiosidade, Lu? Vai logo perguntando aí! rsrsr 

DMJ: Eu ia perguntar se você é mais do mar, do ar ou da terra.

Edvana: Ah, eu amo o mar, mas eu sou de todos os elementos. Eu sou do vento, eu acho ele poderosíssimo porque ele mexe e leva o fogo pra onde ele quiser, e também mexe as águas. Amo a terra que é onde germina a vida, a água que é pura vida. Eu acho que eu sou de todos os elementos, mas acho também que qualquer ser humano é mais da água do que da terra. Até o nosso planeta é muito mais água e nosso corpo é composto por água em sua maioria. A água mexe muito com a gente, desde sempre. Basta dizer que ficamos 9 meses encubados dentro da água. Quando a gente entra numa banheira, ou até no mar que não tenha muita onda, que está morninho, não dá vontade de sair. Por isso que as águas da Bahia de Todos os Santos são mais gostosas que as da Guanabara, porque as nossas águas são uterinas, têm uma temperatura acolhedora e a gente vai ficando. Eu sempre senti isso.

DMJ: Uma música

Edvana: Uma música que me toca muito é “Alegria, Alegria” do Caetano. “Sem lenço sem documento…nada no bolso ou nas mãos…”. Quando eu era menina, ouvia essa música tocando, ainda na década de 70, na época da ditadura. Eu não sabia direito o que ela queria dizer, mas sentia que estava falando de liberdade. E uma vez eu encontrei Caetano e falei isso pra ele. Ela tem a ver com a minha infância e tem a ver com a minha vida de hoje, porque a gente está passando por um processo de transformação muito grande no nosso país. E eu sou assim, bem livre.

DMJ: Uma frase

Edvana: Quem não tem cão, caça como gato. Porque a minha vida inteira foi assim rsrs

DMJ: Edvana Carvalho por Edvana Carvalho

Edvana: Ah eu sou alegria. E sou uma mulher muito forte. Eu venho dessa linhagem de mulheres que tomam conta e que transformam. E tudo isso com muito humor, com muita alegria, com muito riso e com muita gargalhada.

Galeria:

DMJ: Edvana, meu amor! Muito obrigada por participar da nossa Janela. Adorei o nosso bate-papo e espero que ele seja o primeiro de muitos. Siga na luz porque você é a própria luz!!! 

Edvana: Ah Lu, que lindo de se dizer. Eu também amei nosso papinho lindo, nesse lugar lindo. Você faz reportagem com consciência, com verdade, sem querer tirar proveito. Te desejo todo amor e sucesso. Siga em frente fazendo um trabalho limpo, inteligente é sério. É tudo seu.

 

Lu Leal

Formada em Comunicação Social, atuou na produção do Programa “A Bahia Que a Gente Gosta”, da Record Bahia, foi apresentadora da TV Salvador e hoje mergulha de cabeça no universo da cultura nordestina como produtora de Del Feliz, artista que leva as riquezas e diversidade do Nordeste para o mundo e de Jairo Barboza, voz influente na preservação e evolução da rica herança musical do Brasil. Baiana, intensa, inquieta e sensível, Lu adora aqueles finais clichês que nos fazem sorrir. Valoriza mais o “ser” do que o “ter”. Deixa qualquer programa para ver o pôr do sol ou apreciar a lua. Não consegue viver sem cachorro e chocolate. Ama música e define a sua vida como uma constante trilha sonora. Ávida por novos desafios, está sempre pronta para mudar. Essa é Lu Leal, uma escorpiana que adora viagens, livros e teatro. Paixões essas, que rendem excelentes pautas. Siga @lulealnews

6 Comments

  1. Avatar
    Dália Leal
    5 de julho de 2016 at 15:15 Reply

    Edvana Caralho, uma baiana forte, profissional séria, competente e linda!
    “Quero q meu aluno veja a escola como ferramenta a favor dele” ” abrir a consciência” “sair das funções subalternas” mto lindas tais colocações, nao tenho como não lembrar do John Dewey, em minha opinião quem melhor definiu a educação, “Educar é preparar para a vida” Educar para crescer” e q influenciou vários países, inclusive o movimento da Escola Nova no Brasil. Edvana, faz exatamente isso! é raro ver alguém tão empenhado em educação nesse nosso Brasil…boa sorte p ela e sucesso sempre!
    Luciana Leal cada vez vc encanta c suas matérias! e a galeria de fotos amei! Parabéns!

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    Paulo Sergio Ribeiro
    5 de julho de 2016 at 15:52 Reply

    Gostei mto da entrevista.
    Estou daqui sempre torcendo pelos artistas, principalmente pelos baianos!
    O sol nasceu p todos e Edvana Carvalho está conquistando seu espaço!
    Parabéns Luciana Leal!

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    Isabel Marisa Freire Carvalho
    6 de julho de 2016 at 00:40 Reply

    Prima Rainha do Milho, Você lutou honestamente, enfrentou várias dificuldades, superou inúmeros obstáculos. Você jamais desistiu e através de um percurso que nem sempre foi favorável, conseguiu conquistar o tão merecido sucesso profissional. Eu tenho orgulho de ser sua prima. És uma belíssima mulher ♡ Amei a sua entrevista.

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    Ana Beatriz
    6 de julho de 2016 at 01:00 Reply

    Parabéns prima! Irei me inspirar em você para realizar meu sonho profissional.

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    Pedro Vivero Valdez
    6 de julho de 2016 at 09:52 Reply

    Muy bella, muchas bendiciones y muchísimas gracias por brindarnos tan buenos ejemplos de vida …

  6. Avatar
    Thelma Diegues
    6 de julho de 2016 at 10:23 Reply

    Edvana essa pessoa sincera,forte,boa ,ótima profissional,ingênua,corajosa,super mãe e super amiga…..Só quem a conhece que sabe o quanto é bom te-la como amiga,e quem não a conhece,acaba de conhecer um pouco dela..Maravilha essa entrevista.Parabéns.

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