Bruno Mazzeo ganhou a primeira máquina de escrever aos 6 anos, presente do pai, Chico Anysio. E começou a escrever quadros de humor ainda bem cedo. Aos 14 anos já era colaborador da “Escolinha do Professor Raimundo”, escrevendo piadas. Hoje acumula vasto currículo como ator, redator e produtor. É o criador da minissérie “Os Filhos da Pátria”, exibida em setembro pela Rede Globo, está no ar com a Nova Escolinha e em cartaz no cinema com o filme “Chocante”. Confira nosso bate papo.
NJ: Você começou a carreira muito cedo escrevendo para a Escolinha do Professor Raimundo. Como foi isso?
Bruno: Será que eu lembro? (risos). Eu comecei a escrever desde criança, amadoramente. Com seis anos ganhei minha primeira máquina de escrever, presente do meu pai. Se fosse hoje os textos estariam na internet, mas naquele tempo não havia internet nem computador. A Escolinha tinha um lado bem inocente em alguns personagens, infantil até. Era mais fácil escrever pra esses. E assim começou.
NJ: Ser filho do Chico abriu portas…
Bruno: Com certeza! Eu seria hipócrita se dissesse o contrário. Além do incentivo, meu pai foi uma grande escola. Mas o grande lance, foi saber conduzir por conta própria depois.
NJ: Qual foi o ensinamento mais importante que seu pai passou pra você ?
Bruno: Eu não vou conseguir te dizer exatamente nada pontual. Mas aprendi muito com ele, sobre a respiração, a matemática do texto, sobre a diferença entre velocidade e ritmo. Enfim, muitas técnicas. Principalmente na escrita, sabe? Foram inúmeros aprendizados porque ele ia ver uma peça minha e falava tudo. Aquela coisa de pai ,né?
NJ: Seu pai foi um gênio na arte de criar e encenar vários tipos de personagens diferentes. Qual deles é o mais marcante pra você e por quê?
Bruno: O meu preferido é o Justo Veríssimo porque com ele vinha a crítica, que pra mim, é o bem mais precioso do humor.
NJ: Ainda mais sendo da mesma profissão…
Bruno: Exatamente! Se sentia até na obrigação de orientar e alertar sobre algo que ele achava que não iria me fazer bem.
NJ: Será que o talento é uma questão de DNA? Outro dia a Renata (Castro Barbosa, ex esposa do Bruno e mãe do seu primeiro filho) me falou que o João já começou a escrever …
Bruno: O João é engraçado. Não sei se está no DNA, mas na convivência. É natural, como o filho do jogador de futebol, o filho do médico. De alguma maneira, você é contagiado pelo ambiente. Se você vem de uma família enlouquecida, você é enlouquecido também (risos). Talvez seja por aí. Será? (risos).
NJ: Por falar no João, você já produziu um filme por causa dele…
Bruno: Os Caras de Pau! Ele adora o Marcius ( Melhem) e o Leandro (Hassum) e sempre reclamava porque ele não podia assistir aos meus filmes por causa da Censura. Então produzimos Os Caras de Pau.
NJ: Como é o Bruno pai?
Bruno: Eu me preocupo sempre em ser um pai presente na vida dos meus filhos. Vou nas reuniões do colégio do João, oriento, educo. Pelo menos uma ou duas noites na semana, ele dorme comigo. Agora com os gêmeos, tenho passado muito tempo com eles, já que fico bastante em casa, escrevendo. Eles são lindos e o João está apaixonado por eles, é padrinho dos dois.
NJ: Bruno, como você tem coragem de dizer que não é um comediante? Não consigo entender..
Bruno: Ah Lu, você sempre fala que eu sou comediante! (risos). É porque eu acho assim: O comediante é um cara naturalmente engraçado. Por exemplo, o Leandro Hassum. Ele é um cara que você vai dar bom dia pra ele e vai rir. O Ronald Golias também era um comediante. As pessoas riem do que eu escrevo, riem em da minha peça porque eu estou com o texto. Com ele, eu me garanto, consigo improvisar. That’s the point. Eu fico horas, meses trabalhando no texto. Um dos momentos mais desesperadores da minha carreira foi quando fui participar do “Z.E. – Zenas Emprovisadas”. E olha que era entre amigos, todo mundo ali roubando no jogo pra ajudar (risos). E mesmo assim era difícil.
NJ: Desculpe te decepcionar, mas pra mim você é um comediante. E dos melhores…
Bruno: (gargalhadas) Sabia que ainda não seria dessa vez que conseguiria lhe convencer (gargalhadas).
NJ: Hoje você não é mais tão presente nas redes sociais. Qual foi a maior cilada virtual que você já viveu?
Bruno: Várias… (risos) Eu estava discutindo agora antes de sair de casa com um seguidor. Eu não tenho maturidade para redes sociais (risos). Meu Facebook está bombando, algumas pessoas me chamando de babaca. Já chegou nesse nível. Pena que a gente não tem mais direito de dar opinião hoje em dia. Se tivesse…
NJ: Você saiu do Twitter…
Bruno: Foi. E é o que eu mais gosto porque sempre gostei de frases. Eu lia muito as crônicas de Nelson Rodrigues e sempre marcava as frases. Entrei no Twitter achando que poderia treinar escrever frases curtas e definitivas, queria expor as minhas opiniões.
NJ: Você acha que o humor tem o dever de criticar?
Bruno: Meus ídolos na juventude eram os que questionavam, se posicionavam, protestavam. Eles colocavam o dedo na ferida. E eu acho que o humor tem essa função crítica, além do entretenimento.
NJ: Você esteve em cartaz recentemente com a peça “Sexo, Drogas e Rock’n Roll”, que fui sucesso absoluto. Qual é a maior dificuldade de fazer um espetáculo solo?
Bruno: Meu grilo maior não é nem com o palco, é com o camarim. Você não ter com quem dividir o frio na barriga minutos antes de entrar em cena.
NJ: Você é roteirista, ator, dublador, produtor… existe alguma coisa que ainda não fez e sonha fazer?
Bruno: Muita coisa!
NJ: Qual dos seus talentos você mais gosta de usar?
Bruno: Escrever.
NJ: Você costuma levar situações da sua vida para os textos que escreve?
Bruno: Sempre. As Ciladas por exemplo eram fatos reais que aconteceram comigo ou com amigos. Coisas normas que podem acontecer com qualquer pessoa.
NJ: Qual é a sua opinião sobre o stand up?
Bruno: Respeito quem faz, mas não é a minha praia. Estou focado em outros projetos.
NJ: Qual é a sua opinião sobre o cenário cultural hoje?
Bruno: Acho desesperador. A gente tem muitas coisas culturais, artísticas. Mas é impressionante a dificuldade que a pessoa tem para ir ao teatro, dificuldade pra se comprar uma música que não seja Sertanejo Universitário, pra entender que Ex BBB não é a Fernanda Montenegro, sabe? A gente não deu certo nessa parte. Antigamente se fazia teatro de terça a domingo, às vezes dos sessões por dia. Hoje se faz de quinta a domingo e mesmo assim não lota. E ao mesmo tempo a gente não consegue edital, não consegue patrocinador. Eu tive condições de bancar Sexo, Drogas e Rock’n Roll no início. Hoje eu não teria, mas na época tive. E sou um em milhões. A maioria está fudido, pedindo pra ter gente pra ir assistir. A gente fica sem motivação pra fazer outra montagem. Vê se a gente vai pra Salvador? Não vai, infelizmente! Quando vai é só por um final de semana! Você assiste produções daqui porque vem pra o Rio direto, porque vai pra São Paulo. Mas nem tudo mundo tem essa oportunidade. A gente abre um portal de notícias como a UOL e tem lá: Política, economia, saúde, entretenimento, Big Brother, esporte… é uma sessão, entendeu? Cenário desesperador.
NJ: Qual é a maior dificuldade pra quem quer fazer cinema hoje no Brasil?
Bruno: Olha, se tentar fazer uma não comédia, vai penar. Agora se você quiser fazer uma comédia ruim, fique a vontade. Tem um monte, inclusive as minhas (risos).
NJ: Então o espaço hoje está mais aberto para a Comédia?
Bruno: Sem dúvida! Mas mesmo assim ainda está difícil.
NJ: Você declarou que a ideia de produzir o filme “E aí, comeu?” surgiu no Carnaval da Bahia. Como aconteceu?
Bruno: Eu tinha acabado de me separar e fui com amigos passar o carnaval na Bahia. E percebi que as coisas estavam muito diferentes da minha última “solterice” (risos). A gente teve a ideia de falar sobre as novas relações e eu lembrei desse texto do Marcelo Rubens Paiva.
NJ: Você é muito ligado à arte. Quais são as suas preferências na música e na literatura?
Bruno: Na literatura Rubem Fonseca e na música Tim Maia.
NJ: Recentemente você gravou outra temporada da Escolinha do Professor Raimundo, fazendo o próprio Professor Raimundo, personagem que foi do seu pai. Teve algum tipo de dúvidas para aceitar o convite para participar desse projeto?
Bruno: Sim, mas só no primeiro momento. Fiquei pensando se eu queria mexer nisso, pois tem tão pouco tempo que o meu pai morreu. E hoje em dia, todo mundo é tão julgado o tempo inteiro, eu não sabia se queria entrar nesse julgamento. Mas pensei, conversei com amigos e resolvi fazer, sempre encarando como uma homenagem. Eu digo que fazer a Escolinha foi uma homenagem de amor. Estou muito feliz por poder participar de uma homenagem à pessoa mais importante da minha vida.
NJ: Esperava toda aquela repercussão?
Bruno: Não, foi uma surpresa, uma mistura de sentimentos.
NJ: Como seria o paralelo entre o tipo de humor da Escolinha e o tipo de humor de hoje?
Bruno: O formato da Escolinha é mais tradicional. Mas aqui cabe uma frase do meu pai: “Não existe humor velho e humor novo. Existe humor engraçado e humor sem graça”. E claro, existem várias maneiras de fazer humor. Tanto o engraçado quanto o sem graça.
NJ: Você está em cartaz no cinema com “Chocante”. Do que trata o filme?
Bruno: Trata de uma Boy Band que fez muito sucesso nos anos 90 e que resolve voltar 20 anos depois e aborda o que cada um dos seus integrantes fez com a própria vida durante esse tempo.
NJ: Como foi a preparação para cantar e dançar no filme? (risos)
Bruno: A gente dança super bem e teve que fingir que dança mal (risos). Na verdade eu sou super tímido, mas quando você está no set, essa timidez é escondida em algum lugar, geralmente atrás do próprio personagem. E a gente se jogou mesmo!
NJ: Como ficou o coração com a estreia do João?
Bruno: Não foi planejado. Ele estava comigo no set e o diretor sugeriu que ele substituísse um ator que havia sido escalado mas não tinha o perfil do personagem. Foi uma emoção muito grande.
NJ: Qual foi a motivação para escrever “Os Filhos da Pátria”?
Bruno: Eu queria falar do jeitinho brasileiro, do motivo pelo qual as coisa não funcionam aqui, falar da nossa essência. E sempre gostei de brincar com a história. A série é uma junção das duas coisas. São 12 episódios. Os personagens são adoráveis pois são vividos por grandes atores, mas são abomináveis em suas personalidades.
NJ: Ela se confunde com o que estamos vivendo hoje?
Bruno: Sem dúvidas. Enquanto estávamos escrevendo, já percebíamos essa relação. Lamento muito falar de 300 anos atrás e perceber que de lá pra cá tão pouca coisa mudou. A independência é apenas um dos recomeços do Brasil, o país vive recomeçando na esperança de dias melhores.
NJ: Uma frase
Bruno: Uma que o meu pai falava muito: “ O Sucesso é um acidente de percurso”. O normal é a gente trabalhar, trabalhar, trabalhar e eventualmente vai ter o estouro em algum momento.
NJ: Você declarou que não tem medo do fracasso. O que o assusta?
Bruno: Eu não penso no fracasso nem no sucesso, só quero fazer o meu trabalho e o resto é consequência. Não faço questão de glamour. Meu medo é ficar impossibilitado de exercer o meu trabalho.
NJ: Bruno Mazzeo por Bruno Mazzeo
Bruno: Vou parafrasear o Raul: Não sei pra onde estou indo, mas estou no meu caminho.
Galeria:
NJ: Bruno, muito obrigada! Espero poder contar com a sua participação outras vezes nessa Janela que também é sua. Beijo de luz!
Bruno: Obrigada você, Lu! E olha…eu amo Salvador num grau… se eu pudesse iria lá pelo menos umas seis vezes no ano! (risos).
1 Comment
Dalia Leal
28 de novembro de 2017 at 11:04Luciana Leal parabéns pela perfeita entrevista!
Amei tudo, inclusive a excelente galeria de fotos❤⛤