Mateus Solano começou a carreira na TV em 2009, quando interpretou Ronaldo Bôscoli na Minissérie “Maysa”, da Rede Globo. De lá pra cá, tudo que faz vira destaque, como os gêmeos Miguel e Jorge de “Viver a Vida” e o polêmico Félix de “Amor à Vida”. Do tipo que mergulha de cabeça nos personagens, mostra-se disposto a tudo pela profissão. Em cartaz no Teatro Leblon, ao lado do amigo Miguel Thiré, com o espetáculo SELFIE, Mateus nos recebeu para um bate-papo sobre a sua trajetória, o teatro e a paixão pela profissão. Confira:
DMJ: Como surgiu a ideia de montar uma comédia baseada na relação de dependência entre o homem contemporâneo e a tecnologia?
Mateus: Carlos Grum é produtor e amigo. Na verdade, estamos todos entre amigos. Ele nos propôs fazer um trabalho sobre Selfie, que foi a palavra mais citada na internet no ano passado. O projeto foi criado em cima da palavra e foi tomando forma graças aos profissionais que trabalham com a gente. A Dani Ocampo, que também é uma grande amiga, fabricou o texto com muita propriedade. Só não tinha trabalhado ainda com o Marcos Caruso, mas já tinha afeto e confiança pela extensa experiência dele com dramaturgia. E ele ajudou muito no texto também.
DMJ: A peça abre uma reflexão a respeito dessa hiperconectividade que, muitas vezes, acaba por desconectar a pessoa do que está a sua volta. É delicado falar sobre isso, porque é uma realidade muito próxima.
Mateus: É muito delicado falar sobre algo que está acontecendo porque não é uma coisa que a gente tem um distanciamento crítico. Então, a gente tem que tomar muito cuidado para não ditar regra, não colocar uma opinião fechada sobre o assunto. O segredo pra tudo é o meio termo, nem 8 nem 80. A peça é muito mais uma reflexão do que uma crítica. Mas a gente fala com muito humor dessa relação esquisofrênica com o celular. A gente se relaciona com os outros através do celular, nossa memória foi substituída pela memória do celular, nossos afetos passam por ele. E se hoje você não é alguém no virtual, parece que não é ninguém no real. Você precisa ter uma identidade virtual pra ser alguém. A gente não está muito longe do que acontece na peça por mais engraçada que sejam as cenas.
DMJ: Como funcionou o processo de preparação para o espetáculo?
Mateus: Fizemos esse trabalho por três meses, jogamos muitas histórias fora, personagens fora. E chegamos nesse espetáculo que é a história do Claudio.
DMJ: E qual é a história do Claudio?
Mateus: O Claudio é um homem super conectado que cria um aplicativo para concentrar toda as suas informações do mundo virtual em um único local, comandado por ele. E deixa cair café neste aparelho. Perde tudo. A partir daí vamos vendo essa exacerbação que é perder fotos, publicações, seu perfil na internet e perder a sua própria existência. Em um dos inúmeros personagens que o Miguel faz, fala : “ Cláudio agora você não existe mais, vamos ter que te reconstruir” e reconstruir como? Através das memórias da família e dos amigos. E é o próprio Miguel quem faz todos esses personagens. São personagens muito engraçados, mas que contam a história. Não se trata da graça pela graça.
DMJ: O espetáculo modificou de alguma forma a sua relação com o celular?
Mateus: Eu não sou muito de Facebook, Twitter e etc. Mas sou muito de whatsapp e de tirar foto. A gente vira um pouco escravo dessa tecnologia, né? Porque a nossa família está lá, os amigos estão lá. E as pessoas cobram quando você some.
DMJ: Selfie é o autógrafo do mundo moderno? rs
Mateus: Sim, claro! rs E é muito bacana isso! Quase todo mundo tem um celular que tira foto, então já se aproximam da gente pedindo pra fazer o selfie.
DMJ: Vamos voltar um pouquinho no tempo. Quando decidiu que queria ser ator?
Mateus: Muito cedo. Comecei a fazer teatro ainda na escola e sempre fiz com a seriedade de um profissional, mesmo quando fazia teatro amador. Mas arte no Brasil é uma coisa muito complicada, pouco incentivada. Eu fiz uma escolha muito cedo e ao mesmo tempo muito difícil. Devo muito ao apoio e a estrutura familiar que sempre tive.
DMJ: Fazer teatro é fundamental na sua vida?
Mateus: Totalmente. Ary Fontoura tem uma frase que diz: “ É no teatro que a gente ganha o óleo para trabalhar na televisão” e eu concordo plenamente com ele. Uma vez me viram beijando o palco antes de entrar em cena e perguntaram se era superstição. Mas não é superstição, é carinho.
DMJ: Como você conseguiu fazer teatro enquanto interpretava o Félix de “Amor à Vida”?
Mateus: Boa pergunta! Até hoje eu não sei…rs. Mas a resposta está aqui nos cabelos brancos (Mateus mostra os fios de cabelo branco) e na certeza de que eu jamais faria isso de novo. Inclusive eu adiei uma temporada em São Paulo para o ano seguinte.
DMJ: Foi um personagem que exigiu muito de você.
Mateus: Foi. Com o Félix eram 24 horas por dia. Era tudo que eu tinha pra dar e mais um pouco, esgotou todas as minhas ferramentas. Um personagem que ia do humor escrachado até o drama profundo. Era todas as coisas possíveis. Um verdadeiro arco-íris rs
DMJ: Mas foi um sucesso inquestionável e ainda hoje existem vários perfis do personagem nas redes sociais. Essa semana um deles postou: “ O mais difícil é ter que carregar o celular três vezes por dia”. E com essa postagem vimos o Félix fazer uma referência ao tema de “Selfie” rs. Essa questão da bateria também entra na peça, né?
Mateus: Verdade! rs A necessidade de viver através da tecnologia e estar sempre com a bateria carregada. O Claudio percebe de repente que a grande máquina, o grande poder está na nossa cabeça. Então, ele enfia o computador dentro da cabeça dele e não precisa mais de bateria. Ele é o wi- fi, via satélite e tem todas as informações na ponta dos dedos. Mais conectado do que ele, impossível. E vamos ver o que acontece. Tem que ir assistir a peça. Você vai assistir hoje né, Lu?
DMJ: Vou sim e confesso que estou ansiosa! rsrs. Agora vamos falar um pouco da sua trajetória. Em “Viver a Vida” você interpretou os gêmeos Miguel e Jorge. Como foi interpretar 2 protagonistas, com personalidades tão distintas em uma mesma novela?
Mateus: Uma oportunidade única. Foi desgastante e ao mesmo tempo muito importante. O trabalho é em dobro, mas o retorno também vem em dobro. Eram dois irmãos com personalidades totalmente diferentes. A gente que é ator de teatro, acaba se acostumando em fazer 2, 3 personagens ao mesmo tempo. Mas em uma mesma novela, durante oito meses e um contracenando com o outro, foi uma oportunidade incrível. Eu aprendi muito.
DMJ: Você é casado com a também atriz Paula Braun. Acredita que trabalhar na mesma profissão favorece a relação?
Mateus: Com certeza. Inclusive a gente se conheceu trabalhando em um curta. O ator que ia fazer sumiu e me chamaram de última hora. A nossa primeira cena foi na cama, fazendo o papel de dois amantes. A Paula é maravilhosa, o grande amor da minha vida.
DMJ: Você protagonizou o primeiro beijo gay da emissora. E o beijo teve até nome…
Mateus: Sim, foi uma homenagem aos primeiros beijos e demos o nome de beijo Tarcísio Meira. Boca fechada, mas com muita intensidade, paixão. Foi bonito começar dessa forma. E o beijo que foi transmitido, não foi o primeiro daqueles dois, isso ficou bem claro. Eles já tinham ido pra cama, foi um beijo do cotidiano, de “eu te amo e não posso viver sem você”.
DMJ: E o final do Félix foi tão lindo…
Mateus: Me arrepio porque acho que tudo foi muito bem construído pelo Walcyr. E o final dele com o pai na praia, finalmente autenticou a relação entre os dois de amor e respeito. E isso repercutiu muito. Eu ouvi histórias lindíssimas. Não foi uma, nem foram dez. Foram inúmeras histórias de filhos que não falavam com o pai e de repente o pai liga anos depois para fazer as pazes. Ou do filho gay que assistiu a cena em um cômodo do casa e o pai homofóbico em outro e de repente um abriu a porta e se abraçaram emocionados. Muita gente começou a se aceitar melhor a partir dali.
DMJ: Em um determinado momento começou a ter uma certa pressão popular em torno do beijo gay. Mas o personagem levantou questões super profundas como o pai homofóbico e a sociedade no armário. Qual foi a repercussão deste trabalho na sua carreira?
Mateus: A novela teve esses embates e frases que foram ditas pela primeira vez na televisão brasileira como o César perguntando “Como é a relação que você tem com esse menino? Quem é o homem e quem é a mulher?” e ia para o comercial. Quando voltava, ele já dizia que não queria mais saber rs. E falava sempre: “Não sou um homem preconceituoso, não tenho preconceito com nada. Mas filho meu não é viado”. Foram frases emblemáticas colocadas na boca de Antônio Fagundes, abrindo portas para a Nathália Timberg e Fernanda Montenegro fazerem hoje, algo que já havia sido feito na TV. Eu realmente tenho um orgulho muito grande, mas esse orgulho veio depois, com o tempo, porque na hora eu estava no meio do furacão. Fazer o Félix foi realmente muito legal, até hoje as pessoas lembram com muito carinho do personagem.
DMJ: Isso te surpreendeu? Porque trata-se de um personagem que no primeiro capítulo joga um bebê em uma caçamba.
Mateus: Mas tinha humor. É o humor que salva tudo. Graças ao humor a gente pode enviar uma mensagem para o público que quer rir. Essa é a cultura do entretenimento que a gente vive. Através do humor, a gente consegue muita coisa na vida de maneira geral. E o Félix, além do humor, tinha uma verdade profunda, as pessoas perceberam que ele tinha muitos conflitos e realmente só queria ser amado. Acredito que isso quebrou um pouco a cabeça do público. E eu fiquei muito feliz por conseguir mexer tanto com as pessoas através de um personagem da televisão. Até então, eu achava que isso só era possível no teatro. Conseguir essa visibilidade para esse trabalho é realmente motivo de orgulho.
DMJ: É mais bacana fazer o vilão?
Mateus: Eu não digo mais bacana, mas é muito legal. Enquanto o mocinho fica preso dentro dos valores, o vilão sempre tem conflitos e se envolve em várias situações para conseguir o que quer. Ninguém nasce mau. A pessoa torna-se má por algum motivo. O Félix foi um personagem inédito na teledramaturgia brasileira por ser um vilão gay. E a autenticidade do personagem era uma coisa encantadora.
DMJ: Você tem alguma mania estranha além de comer pimenta? rs
Mateus: Lu, comer pimenta é uma mania estranha? rs Você sabe tudo da minha vida! rs
DMJ: Uma frase.
Mateus: “Só sei que nada sei”. Sócrates. Essa é uma filosofia de vida que eu recomendo. Mais questões e menos certezas. Sempre.
DMJ: Um sonho.
Mateus: Meu sonho é sempre no gerúndio, o vivendo. Acho perigoso traçar uma meta porque dá um desespero quando alcança.
DMJ: Mateus Solano por Mateus Solano.
Mateus: Um homem que tem o mundo todo na cabeça.
DMJ: Mateus, muito obrigada! Que você continue escrevendo essa história brilhante na TV, no teatro e no cinema. A gente fica daqui acompanhando e aplaudindo você. Beijo de luz!
Mateus: Obrigado, Lu. Pelas palavras, pela entrevista e também pela alegria de estar aqui hoje com a gente. Um beijo!
Galeria:
Clique AQUI e confira a matéria completa sobre o espetáculo SELFIE.
AGRADECIMENTOS:
Aos amigos Stella Stephany e João Pontes
SERVIÇO:
Luciana Leal veste look Bruna Araújo e acessórios Empório Valentinni
Teatro Leblon (sala Fernanda Montenegro): Rua Conde Berdotte n 26 – Leblon
Sexta e sábado às 21:00
Domingo às 20:00
6 Comments
Dalia Leal
18 de junho de 2015 at 15:25Encantada! Caetano já falou q baiano sempre encanta, daí só tenho elogios p essa amadurecida entrevista, c perguntas adequadas, e vale ressaltar q vc Luciana Leal enfocou um tema e tirando todas as dúvidas imagináveis p nós, aliás essas eram exatamente as perguntas q eu gostaria de ter feito so Mateus Solano; importante se faz salientar q DMJ tirou todas as minhas dúvidas em relação à espectativa do ator c o personagem Félix. E quanto à SELFIE, quero muito assistir, pois esse tema nos reporta a grande reflexão e é importante frisar q trata-se de um tema em voga em nossa sociedade e no mundo atual!
Lia Garrido
18 de junho de 2015 at 16:39Que entrevista maravilhosa! Eu fui lendo bebendo cada palavra, querendo saber o que vinha depois. Mas ao mesmo tempo, com pena de terminar. Adorei de verdade. Vou ficar aguardando as próximas. Parabéns!
Claudio Bispo
18 de junho de 2015 at 16:42Entrevista bem humorada e com perguntas inteligentes. Gostei!
Lucas Alves
18 de junho de 2015 at 16:49E é tão bom, quando você presencia a cada momento a realização daquela amiga que você tanto venera.
É felicidades demais…Parabéns, Luciana!
Graça Parente
12 de agosto de 2015 at 12:33Amei as entrevistas dos “maravilhosos ” atores de Selfie!!! Mateus e Miguel!!! Perguntas muito bem formuladas , sem ti ti ti , diretas e inteligentes!!! Parabéns e respostas deliciosas de ler!!! Ambos, apesar da fama e badalarão , ultra simples, humanos e sobretudo gente como a gente!!! Vamos com um grupo de 40 pessoas aqui de Volta Redonda no sábado 22/08 !!! Bjs PARABÉNS!!!maiúsculo!!!
Antônio Ricardo
26 de outubro de 2015 at 09:44Entrevista leve, descontraída… Gostosa de ler. Com a brilhante Luciana. Parabéns pelo belíssimo trabalho!!!!!