Ela começou a fazer teatro nos anos 90, mas foi através da personagem “Neuzão” do filme “Ó Paí Ó” que ganhou notoriedade nacional. A partir daí, integrou o elenco de algumas novelas da Rede Globo, sem jamais abandonar o teatro, sua grande paixão. Confira nosso bate-papo com a atriz, produtora, diretora e dramaturga Tânia Tôko, sobre a política cultural brasileira e sua trajetória artística.
DMJ: Tânia, quando decidiu que queria ser atriz?
Tânia: Uma amiga, atriz, sinalizou que eu era comunicativa, que me expressava bem e que tinha muita desenvoltura para o teatro. Então, fiz o primeiro curso em 1989, na escola de teatro da UFBA, me apaixonei e não parei mais.
DMJ: O Bando de Teatro Olodum traz a cada espetáculo uma reflexão da situação do negro na Bahia e em todo o país. Como conheceu o Bando?
Tânia: Fui assistir, na antiga sala do coro do TCA, o primeiro espetáculo do grupo “Essa é a Nossa Praia”. Na ocasião, eu estava fazendo o meu segundo curso na escola de teatro, em 1990. Me vi projetada e representada naquele momento e percebi que era aquele teatro que queria fazer. O discurso tinha uma conotação social, falava das mazelas da sociedade, o que me causou uma identificação imediata. Fiz o teste para o grupo e passei. Lá permaneci por sete anos, de 1991 a 1998…um ciclo. O Bando faz parte da minha trajetória artística e agradeço por ter participado de um grupo tão significativo para o teatro baiano e brasileiro.
DMJ: Quem são as suas referências na dramaturgia?
Tânia: Chaplin, Dina Sfat, Ruth de Souza, e tantos outros que admiro e me inspiro.
DMJ: Qual é a sua opinião sobre a atual política cultural brasileira?
Tânia: Vejo que a nossa cultura está inserida na crise atual brasileira, tanto em relação a economia, quanto na qualidade artística, pois o artista nunca pode parar de estudar, de se aprimorar. Aliado a isso, vejo artistas já consolidados recebendo milhões de incentivo, enquanto outros mendigam dez mil para tocar um projeto. As oportunidades são bem seletivas.
DMJ: Quais são as principais dificuldades enfrentadas por quem quer viver de teatro no Brasil?
Tânia: Primeiro que nenhum artista vive só de teatro no Brasil, muito pelo contrário, temos que trabalhar nas várias áreas da arte para assim nos mantermos em cena. E acredite, muitos desistem no meio do caminho. Produzir e fazer teatro no Brasil é coisa para guerreiro!
DMJ: Você declarou que não gostaria de fazer um papel de negra vitimada. Como você avalia o reconhecimento multiracial na dramaturgia?
Tânia: Esse reconhecimento ainda é para poucos. Se o artista negro não tem relevância em seus papéis, nunca terá um espaço real na mídia ou na publicidade. O perfil nunca é o que o cliente procura. Aí só entregando a Deus o nosso destino…
DMJ: “ Ó Pai Ó”, é um filme que retrata o cotidiano de um grupo de moradores do Pelourinho e que teve a maior parte do elenco baiano. Como foi o processo de sair do teatro, ir para o cinema e para a TV?
Tânia: Foi sair da zona de conforto, do lugar comum e experimentar um novo caminho, que não é nada fácil, é árduo e complexo. Ter talento e o carisma que agrada a massa, não são fatores determinantes para se manter vivo em um espaço tão competitivo, com vários aspectos extremamente relevantes. Mas eu adoro cinema, quero fazer mais vezes. Em relação a TV, desejo que as oportunidades de trabalho que dão aos artistas negros sejam mais humanos e mais representativos. Desejo ver os nossos protagonizando novelas e séries, apresentando programas. Grande parte da população é negra e nós não nos vemos efetivamente representados nessa mídia tão poderosa.
DMJ: O filme abordou temas como intolerância religiosa, racismo e homossexualismo. Você acredita que levantar temas como esses, no cinema e na TV, incentivam reflexões e ajuda a educar a população em relação ao preconceito?
Tânia: Certamente. Na época do filme ocorreram várias abordagens sobre o que falávamos, como dos evangélicos e da polícia militar. Tratava-se de uma ficção, porém, sustentada pela realidade. Assim é a literatura, realizada dentro de contextos sociais, econômicos, religiosos, tudo baseado no que acontece aqui e agora. Falar sobre assuntos tão velados ajuda as pessoas a se abrirem ao novo, a reflexão. A arte tem esse poder de transformar algo ruim em algo bom.
DMJ: Neuzão foi um sucesso na mídia. Como se deu o processo criativo para construção da personagem?
Tânia: Construí essa personagem através de exercícios de improvisação. Assim que entrei no Bando, em 1991, montamos “Ó Paí Ó” em uma semana e apresentamos. No princípio, era só o resultado de um experimento e depois cresceu. A pesquisa de campo, os comportamentos, o feedback de amigos, contribuíram para o sucesso dessa linda personagem.
DMJ: Quais lembranças guarda da Rosa de “Em Família”?
Tânia: O desafio de mostrar uma empregada humana, com densidade dramática e não só o fazer rir por rir, foi muito satisfatório para mim. Ao contracenar com ícones da TV Globo, aprendi muito mais, pois a técnica de TV não é fácil, ainda mais quando temos o umbigo enterrado no teatro. Rosa foi um presente delicado que recebi de Manoel Carlos. A única palavra que me vem a cabeça quando falo da Rosa e desse trabalho, é gratidão.
DMJ: Como foi a experiência de atuar em Malhação, folhetim que é sucesso há mais de 20 anos na TV Globo?
Tânia: Em Malhação aconteceu algo interessante. Entrei pra ser uma diarista e madrinha do MC Pilha e logo nos primeiros capítulos, mudaram minha sinopse quase toda. Isso foi maravilhoso, um novo desafio. O protagonista que entrou no meio da trama foi parar justamente na minha casa. Eu pensei, e agora? Mas administrei e encarei. Deu tudo certo, foi um sucesso estrondoso. Saí de lá direto para a novela “Em Família”. Esse trabalho ficou marcado na minha trajetória artística.
DMJ: “Nu Buzu” é uma criação sua? Como surgiu a ideia de levar para o teatro o cotidiano dentro de um coletivo?
Tânia: Sim, criação, produção, direção e também atuo. Sempre andei de coletivo para trabalhar, para estudar, e sempre observava bastante os comportamentos ditos democráticos, e em sua maioria, engraçados. Pensei, “isso dá texto, dá peça”. Montei uma cena de 15 minutos e fez tanto sucesso que transformei em um espetáculo de 1 hora. Ano passado ele completou sete anos e fiz uma temporada de um mês, no espaço Xisto Bahia em comemoração. Foi lindo! Amo Nu Buzu!!
DMJ: De onde busca forças para transpor os obstáculos da vida?
Tânia: O que me move é a fé. Creio em Deus e sou contrita no bem. Acredito que tudo está escrito, nosso destino, nossa felicidade ou infelicidade, sucesso ou fracasso. Cabe a pessoa ser resiliente e não desistir nunca da vida. Viver é uma dádiva. A força, tiro do meu sorriso e da minha consciência que deita e dorme sem remédio algum, pois ela é limpa. Viver é para os fortes, e para os fracos também.
DMJ: Qual foi o seu maior desafio como atriz até aqui?
Tânia: Gravar cenas engraçadas dois dias depois que enterrei minha mãe. Tinha contrato e tive que cumprir, foi pirante, muito difícil mesmo.
DMJ: Como você lida com as críticas?
Tânia: Acho positivo que haja críticas, ela faz mudar pontos de vista, melhorar algo, se a crítica for coerente e construtiva. Falível somos e aceitar uma crítica, na pior das hipóteses, fará você refletir…
DMJ: Como é a sua relação com a religião?
Tânia: Muito boa, frequento o candomblé desde que nasci, minha avó era mãe de santo. Cresci nesse contexto, me faz bem, me dá paz. Assim como rezo um Pai Nosso, salmos, ou um mantra indiano e fico bem e feliz, me elevo e me protejo de todo mal.
DMJ: Por tudo que você viu e viveu até aqui, tem esperanças de um país melhor?
Tânia: Sempre. Sou otimista demais. O tempo e a justiça divina, são infalíveis. A verdade sempre aparece, nós passaremos por essa fase angustiante, se Deus quiser. E Ele quer.
DMJ: Uma frase
Tânia: O que eu ganho e o que eu perco ninguém precisa saber…
DMJ: Um lugar
Tânia: Vila santo Antônio, Diogo
DMJ: Uma Música:
Tânia: Amor Perfeito, de Roberto Carlos
“Fecho os olhos pra não ver passar o tempo
Sinto falta de você
Anjo bom, amor perfeito no meu peito
Sem você não sei viver…”
DMJ: Tânia Tôko por Tânia Tôko.
Tânia: Uma mulher romântica, sensível, amiga, carinhosa, que adora ver a felicidade do outro. Me sinto bem com as coisas simples da vida, uma praia, uma cerveja gelada e um peixinho frito tá bom pra mim!
DMJ: Tânia, muito obrigada! Espero poder contar com a sua participação outras vezes na nossa Janela! Beijo de luz e sucesso!
Tânia: Obrigada você pela oportunidade, Lu. Amor, carinho, luz e paz!
Galeria:
5 Comments
Dália Leal
11 de julho de 2016 at 19:24A pessoa que “crê em Deus transporta montanhas”, vence obstáculos! e ser contrita no bem, esse é o exemplo q nos passa Tânia Tôko. Ela corre atrás dos seus objetivos dignamente, com sua honestidade, competência e profissionalismo. Seu desempenho em “Ó Paí Ó foi algo inesquecível, Neusão foi personagem marcante e divertida! Deus à abençõe, sucesso sempre!
Luciana Leal, mais uma vez parabéns pela brilhante entrevista! bjo de luz p vc tbém!♥★
Mari Santos
13 de julho de 2016 at 10:37Super bacana a entrevista com a nossa eterna Neuzão. Estamos esperando Ó Paí Ó 2!!
Son Izabel
14 de julho de 2016 at 17:49O Brasil é cheio de talentos e “Neuzão” é uma prova disso!
Maria Rita de Araujo
20 de julho de 2016 at 06:43Tá fazendo falta na televisão! Excelente Atriz bjks ? ? ?
Leninha Lcs
20 de julho de 2016 at 06:43Sucesso pra você!