Pedro Paulo Rangel

Pedro Paulo Rangel

Foto: Gisela Schlogel

São 50 anos de história na dramaturgia. Seu extenso currículo contempla mais de 40 trabalhos na televisão incluindo novelas, minisséries, humorísticos e participações em produções infantis, além de inesquecíveis personagens nos palcos e no cinema. Foi com um sorriso nos lábios que o ator Pedro Paulo Rangel nos recebeu no Teatro Poeira, no Rio de Janeiro, onde está em cartaz com “O Ator e o Lobo” para falar sobre o espetáculo, sua trajetória artística e a decisão de dedicar-se exclusivamente aos palcos.

NJ: Pedro, você está em cartaz  com o espetáculo “ O Ator e o Lobo” no Teatro Poeira até o dia 2 de junho. Quais são as questões levantadas no texto e o que mais o empolga nesse trabalho?

Pedro Paulo: O espetáculo é uma montagem feita com os textos das crônicas do romancista português António Lobo Antunes, junto a algumas tentativas minhas de emulá-lo. As questões são basicamente memorialistas, usando de emoção e humor. O mais empolgante, além de estar no palco comemorando meus cinquenta anos de carreira, é poder trazer para descobrimento e deleite dos brasileiros a obra deste tão belo autor.

NJ: Quais são as dificuldades de fazer um monólogo?
Pedro Paulo: Só quem faz é que sabe a dor e a delicia… É solitário, mas muito livre.

NJ: Além de ser um momento para apreciação da arte cênica, quais são as sensações que espera sejam despertadas no público durante o espetáculo?
Pedro Paulo: Sou bastante pretensioso quanto às sensações. Quero que o público experimente o maior número possível das que o texto oferece. São muitas, de vários matizes e intensidades.

NJ: O espetáculo fala sobre memórias. Quais são as suas memórias que mais valem a pena serem lembradas?
Pedro Paulo: Acho que prefiro deixar que o público que for ao teatro conferir a peça tente descobrir quais são as memórias que pertencem ao Lobo, e quais as genuinamente minhas…

NJ: São 50 anos de história na dramaturgia. Como avalia a sua trajetória profissional?
Pedro Paulo: Sou um filho único de funcionários públicos, não consegui cursar uma faculdade, mas sempre tive acesso à informação, comecei a trabalhar aos dezoito anos (tarde, se você for ver a idade dos garotos que começam na lavoura), e sempre tive muita sorte. Algumas pessoas acham, e eu me incluo entre elas, que a sorte precede o talento numa hipotética lista ” Atributos para Dar-se Bem na Vida Artística”. Tive sucessos e fracassos e tento, agora aos setenta anos, cometer apenas erros novos.

NJ: Como é pra você saber que faz parte da história artística do nosso país?
Pedro Paulo: Fico muito honrado. Mas estamos todos contando tempo para sermos esquecidos.

NJ: Pra você, o teatro pode transformar a realidade de uma criança?
Pedro Paulo: Acredito que o que vai transformar realmente a realidade de uma criança, ou mesmo de um adulto, é a educação. Se essa pessoa permanecer na platitude onde se encontra o nível da nossa educação hoje, ela nunca irá por os pés num teatro, o que dizer então de subir num palco.

NJ: Você protagonizou o primeiro nu masculino na versão televisiva de “Gabriela” (1975). Como foi a experiência e como avalia essa relação entre o corpo e a arte?
Pedro Paulo: A experiência foram dois dias em que a Cidinha Milan e eu ficamos nus, em baixo das mangueiras dos carros pipas do Corpo de Bombeiros. A cena vista hoje é risível: dois pixels, correndo de um lado pro outro, lá no fundo da tela. Estou cada vez mais convencido que o objetivo da relação entre o corpo e a arte é impressionar os sentidos.

NJ: Em “Pedra Sobre Pedra” (1992) você interpretou o Adamastor, personagem homossexual que caiu nas graças do público. Hoje, infelizmente, alguns personagens gays são muito estereotipados e chegam a ser rejeitados. Acredita que independente da forma, abordar a causa LGBT nas telenovelas é um passo para alertar a população contra o preconceito?

Pedro Paulo: O povo brasileiro é conservador e preconceituoso. E hipócrita. Prega uma coisa em casa e faz outra na rua. Tudo bem em relação à discutir LGBT em mídias populares. O que escandaliza é não colocar gente competente e isenta para gerir os fóruns onde se discutem esses assuntos.

NJ: Em “A Indomada” (1998) você fez um líder religioso que vivia em choque com as beatas da cidade devido ao comportamento diferente do que era esperado para um padre. Como foi a repercussão do personagem? É preciso tomar algum tipo de cuidado ao abordar os diversos tipos de religião na teledramaturgia?

Pedro Paulo: Acho perigoso falar em “algum tipo de cuidado” porque os defensores da censura andam expondo suas garras. Acho que neste caso é outra vez um problema de educação. Tirando os fanáticos, obviamente, se as pessoas fossem informadas e esclarecidas poder-se-ia conversar e discutir civilizadamente esses assuntos.  Mas não houve, que eu soubesse, nenhuma repercussão negativa em relação àquele meu trabalho.

NJ: Ainda sobre religião, em 2012 você fez o Zé em “Amor Eterno Amor”, trama que abordava reencarnação e espiritismo. Esse tema o interessa? Qual papel da religião em sua vida?

Pedro Paulo: Fui criado na religião católica, passei por muitas experiências religiosas e hoje sou agnóstico.

NJ: Você integrou o elenco do humorístico “Viva o Gordo “ ( 1981) a convite de Jô Soares. Alguns anos mais tarde, voltou a participar de outros programas do gênero como “TV Pirata” (1990) e “Minha Nada Mole Vida” (2007). Além de participações em “A Grande Família” (2001) , “A Diarista” (2004) e Sob Nova Direção (2005). Gosta de trabalhar com humor?

Pedro Paulo: Sim, muito. O humor facilita muito a comunicação. É a nossa reação mais espontânea. O Millôr tem uma frase ótima: “O homem é o único animal que ri. E é rindo que ele mostra o animal que é”.

NJ: Em “Vale Tudo” (1988), você deu vida ao Audálio, personagem que acreditava nos valores éticos e sempre enxergava o lado bom de tudo, característica que lhe rendeu o apelido de Polyana. A trama, ao contrário, denunciava a inversão de valores no Brasil e continua cada vez mais atual. Considera-se uma pessoa otimista em relação a isso? Como enxerga a crise política na qual o país mergulhou?

Pedro Paulo: Não, não sou nada otimista. Acho que tudo ainda vai piorar antes de começar a melhorar. No Brasil as crises vem se sucedendo, e esta é filha da última. Por conta da desastrosa administração da esquerda nos últimos anos, caímos nos braços deste pesadelo autoritário e intolerante. É assustador verificar que o Pelé estava certo.

NJ: Se você tivesse o poder de modificar uma única coisa no Brasil, o que seria e por qual motivo?
Pedro Paulo: O caráter do povo. Farinha pouca, meu pirão primeiro. Quebra meu galho, seu guarda.

NJ: Você iniciou a profissão em uma fase de muita combatividade política em relação à cultura e chegou a sofrer sérias conseqüências em virtude da censura. Inclusive participou de Roda Viva, espetáculo que foi considerado símbolo da resistência militar.  Quais eram as suas expectativas em relação à peça?

Pedro Paulo: Olhe, eu estreei com 19 anos, não tinha a menor noção do que acontecia naquela época no país. Quando fiz um teste para o coro de Roda Viva, do Chico Buarque, direção do Zé Celso e passei, pensei que iria ficar num canto do palco, com um blaiser e uma camisa de gola rolê, fazendo backing vocal. E aconteceu tudo o que aconteceu.

NJ: Fala-se muito da falta de qualidade dramática e da falta do elemento surpresa nas novelas atuais. Em sua opinião, por quê elas perderam o impacto?
Pedro Paulo: Não vejo novelas. Não é por nada não. Não via nem as minhas, você acredita? Dava só uma olhadinha nos primeiros capítulos pra ver se o que eu estava fazendo não estava muito ruim. Sempre achei quer eram enormes, 150, 180 capítulos. Hoje estão um pouco menores, mas as histórias são sempre as mesmas e os atores repetidos. Talvez o publico tenha diversificado seus interesses.

NJ: Em 2013 você não renovou o contrato com a Rede Globo para dedicar-se exclusivamente ao teatro. O que o motivou a tomar essa decisão? Foi por uma questão de saúde?
Pedro Paulo: Também. Foi em 2013, eu já estava com 65 anos e estava cansado. A última novela que participei era passada em Belém do Pará (Amor Eterno Amor), e as externas eram na maioria das vezes noturnas, que terminavam por volta de duas da manhã, e na volta eu vinha dirigindo do Projac até Copacabana. Era muito desgastante.

NJ: Resta alguma mágoa em relação à Rede Globo?
Pedro Paulo: Um dos remédios que tomo afeta minha memória, então as mágoas estão perdidas em buracos da minha mente…

NJ: Como foi fazer o Freud no teatro?
Pedro Paulo: Uma maravilha! Estava saudoso do sucesso absoluto. Plateias esgotadas desde o primeiro dia até o final da temporada!

NJ: Se pudesse se encontrar com o menino que foi no passado, o que diria a ele?
Pedro Paulo: Agradecer sempre, sempre agradecer!

NJ: Qual foi a grande lição que o palco lhe deu?
Pedro Paulo: Há que se ter humildade.

NJ: Você se considera um ator realizado ou realizando?
Pedro Paulo: Realizando, claro!

NJ: Uma frase
Pedro Paulo: Repetir, repetir, repetir, até ficar diferente. De Manoel de Barros.

NJ: Um sonho
Pedro Paulo: Trabalhar com Fernanda Montenegro no teatro.

NJ: Um lugar
Pedro Paulo: Minha casa.

NJ: Um livro
Pedro Paulo: Os Maias, de Eça de Queiroz

NJ: Uma comida
Pedro Paulo: Fetuccini à Carbonara

NJ: Uma música que o faz sorrir
Pedro Paulo: Qualquer uma dos Beatles

NJ: O que o deixa verdadeiramente emocionado?
Pedro Paulo: Nossa, tanta coisa… lembro da nota grave de um piano numa sala de concertos vazia

NJ: É possível citar alguns colegas que admira genuinamente?
Pedro Paulo: Não é possível, é uma lista muito muito grande.

NJ: Pedro Paulo por Pedro Paulo (como se define)
Pedro Paulo: Qualquer coisa, estamos aí.

NJ: Pedro Paulo, muito obrigada pelo nosso bate-papo e por ter nos recebido tão bem no Teatro. Parabéns pelos 50 anos de história na dramaturgia e que venham pela frente muitos anos de trabalho com saúde. Um beijo carinhoso.

SERVIÇO –   O ATOR E O LOBO

Temporada: Até 2 de junho de 2019

Dias e horários: Sexta e sábado, às 21h. Domingo, às 19h

Teatro Poeira: Rua São João Batista, 104 – Botafogo

Informações: (21) 2537-8053

Ingressos: R$ 70 (inteira) | R$ 35 (meia)

Vendas: tudus.com.br

Horário de funcionamento da bilheteria:

Terça a Sábado, das 15h às 21h. Domingo 15h às 19h

Galeria:

Lu Leal

Formada em Comunicação Social, atuou na produção do Programa “A Bahia Que a Gente Gosta”, da Record Bahia, foi apresentadora da TV Salvador e hoje mergulha de cabeça no universo da cultura nordestina como produtora de Del Feliz, artista que leva as riquezas e diversidade do Nordeste para o mundo e de Jairo Barboza, voz influente na preservação e evolução da rica herança musical do Brasil. Baiana, intensa, inquieta e sensível, Lu adora aqueles finais clichês que nos fazem sorrir. Valoriza mais o “ser” do que o “ter”. Deixa qualquer programa para ver o pôr do sol ou apreciar a lua. Não consegue viver sem cachorro e chocolate. Ama música e define a sua vida como uma constante trilha sonora. Ávida por novos desafios, está sempre pronta para mudar. Essa é Lu Leal, uma escorpiana que adora viagens, livros e teatro. Paixões essas, que rendem excelentes pautas. Siga @lulealnews

2 Comments

  1. Avatar
    Dalia Leal
    30 de maio de 2019 at 23:26 Reply

    Q maravilha rever o Pedro Paulo Rangel! excelente ator! e q bela entrevista! encantada tbém c a galeria de fotos!👏👏👏🌞🌜🌟💋❤

  2. Avatar
    Rafael Diniz
    29 de janeiro de 2020 at 10:27 Reply

    Um dos melhores atores que já tive oportunidade de assistir no teatro. Excelente entrevista!

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